terça-feira, 17 de março de 2015

Os Abismos da Meia-Noite (1984)


"Os Abismos da Meia-Noite" podia ter o subtítulo "Aquele filme em  que a Helena Isabel e o Rui Mendes aparecem em pelota". Mais coisas se passam no filme, mas pouco mais interessa ao público que ver duas estrelas nacionais nuas em cenários e situações surrealistas.


No século passado vi o filme - de título completo "Os Abismos da Meia-Noite ou as Fontes Mágicas de Gerénia" - na RTP 2, na altura em que foram emitidos outros do realizador como o "Emissários de Khalom" (que anseio por rever, pela temática de ficção cientifica, raríssima no cinema português). Vi o filme, mas pouco mais recordo que precisamente essa cena. Como mencionado acima, os protagonistas eram Helena Isabel e o Rui Mendes, este último ainda antes do sucesso "Duarte e Companhia", mas conhecido principalmente do teatro, da novela "Origens", "Retalhos da vida de um médico", por exemplo; e  Helena Isabel também já era uma figura bem familiar no pequeno ecrã, em papéis em "Vila Faia", "O Tal Canal" e participações no Festival da Canção (1974 "Canção Solidao"; 1980 "Um Abraço, Mais Nada"; 1983 "E afinal, Quem és tu?" a melhor classificação e umas ombreiras épicas, e 1984 "(Já) Pode ser tarde" ).
O IMDB indica a estreia na data de 27 de Janeiro de 1984 (o primeiro filme português a estrear nesse ano, segundo o "Diário de Lisboa") na semana em que estrearam "Staying Alive" (a esquecida sequela de "Saturday Night Fever"), "48 Horas" ou "Feliz Natal Mr. Lawrence".  O "Diário de Lisboa" desse dia adianta uma sinopse e um apelo à sua visualização:
"Realiza-o António Macedo sobre um argumento tecido em torno de uma história "fantástica": um casal que penetra através de uma porta mágica, que se abre uma vez por ano, nos confins de um castelo medieval. (...) uma produção cuidada e com algum fôlego comercial, Os abismos da meia-noite merece que se goste ou não mas não ser recebido com indiferença."
Logo no ínicio o espectador é confrontado com uma situação onírica, com elementos esotéricos e sexuais pouco subtis, para regressar ao mundo real e esses mesmo elementos voltarem a infiltrar-se as poucos na história. O "casal" da sinopse era Ricardo (Rui Mendes),um professor de história, conhecedor das lendas locais que auxilia Irene (Helena Isabel), uma agente de seguros a investigar a morte de um bibliotecário.
Olhando ao cartaz publicado no jornal, apesar da breve cena de nú frontal dos protagonistas, a película ganhou o selo "Maiores de 12 anos" ("A Lagoa Azul", em reposição na mesma época, era "não aconselhável a menores de 13 anos") e tentava os futuros espectadores com um sideboob de Helena Isabel:

Acho deliciosas as exclamações "Finalmente cinema na nossa língua", um reflexo do afastamento de décadas do público e das produções cinematográficas nacionais; e "Uma história fabulosa de amor e  "suspense"!" E no rodapé, chama-se a atenção para o lançamento da banda sonora, algo raríssimo para filmes portugueses. Falando nisso, a "banda musical" esteve a cargo de António de Sousa Dias ("Os Emissários de Khalom", "Chá Forte com limão"), filho do realizador e que se estreava na área da música para cinema. A peculiar fotografia foi responsabilidade de Elso Roque ("O Anel Mágico", "Manhã Submersa"), com cenografia de António Casimiro

Nota: Aspecto geral do LP da "música do filme". Fotos encontradas num site de vendas:

Excerto da Banda Sonora no Youtube:  Coração Já Repousavas (I) + Ante-Cântico (1983).
Consulte os títulos das faixas no Discogs.

O realizador António de Macedo, (que neste caso também escreveu e editou a longa metragem), parte do chamado "Novo Cinema Português",  construiu uma carreira repleta de OVNIs cinematográficos, algumas polémicas e luta contra a censura, arriscando em géneros desprezados e evitados pelos colegas e crítica como se tivessem a peste. Segundo o que li em várias fontes online, "Os Abismos.." alcançou um assinalável sucesso comercial, considerando que é um filme nacional.

Investigando na imprensa da altura, uma entrevista na RTP-1 a António de Macedo no programa "Viva a Cultura", no dia da estreia:
"Diário de Lisboa 27/01/1984"

"Diário de Lisboa 27/01/1984"
 A crítica de Jorge Leitão Ramos:
"Diário de Lisboa 28/01/1984"
 Outra crítica, em versão mais sintética:
"Diário de Lisboa 10/02/1984"
 "Na carreira de António de Macedo este filme é marcante. Pela primeira vez consegue harmonizar o pendor industrial que está subjacente a quase toda a sua obra e o seu universo filosófico pessoal, feito de referências orientalizantes mais ou menos esotéricas. Não sendo um excelente filme, é um trabalho tecnicamente muito cuidado onde todas as coisas funcionam sem nenhuma delas ser excepcional".

"Diário de Lisboa 03/02/1984"



Há algum tempo consegui uma cópia da película, mas não tive oportunidade de assistir. Entretanto, a  recente disponibilização na íntegra no Youtube fez-me resgatar os velhos rascunhos e completar o cromo.
O filme completo no Youtube, cortesia do CinemaXunga:



Se prefererim ver offline, podem encontrá-lo para download no excelente blog "My Two Thousand Movies - Os Abismos da Meia-Noite".


Nuno Markl dedicou ao filme não um, mas dois cromos da "Cadeneta de Cromos", com criação da campanha "Vamos ajudar o Markl a ver o Abismos da Meia-Noite", com direito a jingle e tudo!

Já em 2014 assistiu-se a angariação de fundos para completar o documentário "Nos Interstícios da Realidade – O Cinema de António de Macedo" (de João Monteiro) dedicado à obra do realizador. Podem saber mais detalhes no blog: "Die Elektrischen Vorspiele" e neste trailer:


Mais informação:
Cinecartaz - Público.
MyTwoThousandMovies


Como sempre, o leitor pode partilhar experiências, corrigir informações, ou deixar sugestões aqui nos comentários, ou no Facebook da Enciclopédia: "Enciclopédia de Cromos". Visite também o Tumblr: "Enciclopédia de Cromos - Tumblr".



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2 comentários:

  1. Tal como o Nuno Markl, também eu estava com imensa curiosidade para ver este filme, algo que só vi agora com este link do YouTube, quanto mais não fosse para perceber como é que Rui Mendes e Helena Isabel iam parar àquele estranho local onde lhes desparece magicamente a roupa, uma vez que a sinopse pouco adiantava.

    Os elementos fantásticos da história (em especial o plot twist que acontece a três quartos do filme) são interessantes, se bem que os diálogos das cenas do mundo paralelo, sobretudo os do Magister, soem um tanto pretensiosos e demasiado enigmáticos. Para os dias de hoje, os efeitos especiais e toda a cenografia do mundo paralelo são rudimentares, mas acredito que para o Portugal de 1984 fossem suficientes para serem considerados muito à frente, bem como toda a história do filme.

    Quanto à famosa cena da nudez dos protagonistas, acredito que tenha sido feita sobretudo como chamariz, já que acaba por não ter muita relevância para a história. Se calhar sem instigar a curiosidade do público com a nudez de actores tão conhecidos como Rui Mendes e sobretudo Helena Isabel (que vinha de um ano de 1983 em cheio com o Festival da Canção, a telenovela Origens e o Tal Canal), o filme não teria tido tanta afluência nem seria tão lembrado hoje. (Um pouco à semelhança da cena de sexo em cima de um carro de "O Lugar do Morto").

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    1. Podes crer. Como se costuma dizer "sex sells". Ainda recentemente tivemos uma onda de filmes nacionais de êxito que usavam o sexo como gimmick para atrair espectadores (O Crime do Padre Amaro, etc, etc).
      Não vi o filme todo ainda, e não sou grande fã de esoterismos, mas continuo com curiosidade para o rever e fazer uma review lá para o CINE31. Se estivessemos em Hollywwod, já tinham feito um remake em CGI e 3D...

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