Enquanto o país vive a emoção de ver a Selecção Nacional de futebol ganhar o Euro 2016, nada como recordar aquele continua a ser o mais mítico hino de apoio à selecção. Creio que só a "Força" da Nelly Furtado está no mesmo patamar.
Em 1986, Herman José era já o indiscutível rei do humor televisivo nacional graças a programas tão míticos como "O Tal Canal" e "Hermanias". Em ambos os programas, surgia aquela que era uma das suas personagens mais lendárias, o José Estebes, o famoso comentador desportivo portuense, com o seu cerradíssimo sotaque do "Nuorte", as suas bochechas coradas e com um jarro de bom tinto sempre por perto para o que der e vier. Depois de Estebes, as palavras "substrato" e "pomada" ganharam novo significado. Segundo Herman José, a personagem foi inspirada por dois dos seus antigos managers, ambos nortenhos e cheios de pêlo na venta.
Nesse ano de 1986, Portugal disputaria pela segunda vez a fase de um Mundial de Futebol, vinte anos após Eusébio e companhia terem brilhado no Mundial de 1966 de Inglaterra. As expectativas estavam altas, até porque dois anos antes no Europeu de 1984, a selecção teve uma prestação agradável, caindo apenas nas meias-finais contra uma França liderada por Michel Platini. A selecção nacional que iria marcar presença no Mundial do México contava com nomes como Bento, Carlos Manuel, Jaime Pacheco, Fernando Gomes, Paulo Futre, António Oliveira, Rui Águas e Augusto Inácio. Mas após um bom início com uma vitória sobre a Inglaterra, as coisas rapidamente rolaram para o descalabro não só dentro do campo com confrangedoras derrotas face à Polónia e a Marrocos (então apenas a segunda vitória de uma equipa africana sobre uma europeia num Mundial) como sobretudo fora devido ao infame Caso Saltillo. E Portugal foi-se embora do México pela porta pequena enquanto o torneio prosseguiu, terminando com o triunfo da Argentina liderada por um Diego Maradona tocado pela mão de Deus.
Mas se o Mundial de 1986 foi um descalabro para as cores nacionais, o hino de apoio à selecção era absolutamente vencedor. Bastava apenas o carisma de José Estebes e o génio criativo de Carlos Paião para tal, mas além disso havia todo um alinhamento all-star a acompanhar, com Luís Represas, Alexandra e Dany Silva a cantarem algumas partes e Vitorino, Marco Paulo, Jorge Fernando, Diana e Peter Peterson no coro. E o resultado só podia ser sensacional.
(Estebes - introdução)
Heróica e lusitana gente
Vamos em frente mas combictamente
(Estebes)
Bá lá cambada infantes desportistas
Homens de conquistas
Povo que és o meu
Bola redonda e onze jogadores em frente
Sem temores que as tácticas dou eu
Tragam as gaitas, as bandeiras e a pomada
Vamos dar-lhes uma abada,
Ensinar-lhes o que é bom
Vamos mostrar a esses carafunchosos
Por momentos gloriosos
Quem é a nossa selecçom
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é futebol total
Deixem-se de tretas, forças nas canetas, que o maior é Portugal!
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é futebol total
Deixem-se de tretas, forças nas canetas, que o maior é Portugal!
(Luís Represas)
É atacar agora e defender para fora
Uns são toscos e nem dão para aquecer
(Alexandra)
Suar a camisola e até jogar sem bola
E disfarçar para o árbitro não ver
(Estebes e Alexandra)
No intervalo, solteiros contra casados,
Fandangos, chulas e fados
Para aprenderem como é
(Estebes e Dany Silva)
Durante o jogo qualquer caso lá surgido
Só pode ser resolvido à cabeçada e ao pontapé
(Carlos Paião)
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é futebol total
(Estebes)
Deixem-se de tretas, forças nas canetas, que o maior é Portugal!
(Todos)
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é futebol total
Deixem-se de tretas, forças nas canetas, que o maior é Portugal!
(Alexandra)
Os portugueses já provaram muitas vezes
Saber ser uns bons fregueses das grandes ocasiões
(Luís Represas e Dany Silva)
Nesta jornada nem que seja à pantufada
Nós estaremos na bancada, muito mais que dez milhões
(Estebes)
Força Portugueses
(todos)
Viva Portugal, Portugal, Portugal!
Viva Portugal, Portugal, Portugal!
(Dany Silva)
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é futebol total
Deixem-se de tretas, forças nas canetas, que o maior é Portugal!
(Estebes)
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é efectibamente
Futebol total
Temos de ter coragem, muita força
Pensem nos vossos antepassados có nada
Muito orgulho, muita bivacidade
Vai lá... e um, dois, e um, dois
E vai lá...e cruza...e é golo, e é GOLO!
(todos)
Bamos lá cambada, todas à molhada, qu'isto é futebol total
Deixem-se de tretas, forças nas canetas, que o maior é Portugal!
O single foi campeão de vendas e recordo-me do refrão andar na boca de toda a gente. E recordo-me ainda, na ingenuidade dos meus seis anos, de achar estranho à expressão "força nas canetas", pois as únicas canetas que eu conhecia eram as de escrever e lá tiveram de me explicar que aquelas "canetas" que a canção falava eram na verdade as pernas. Gosto sobretudo da parte do solo de Dany Silva, que canta o refrão a dar uma no trovador africano e outra no soul singer.
A partir do Europeu e 1996, e à parte o Mundial de 1998, a presença de Portugal em Europeus e Mundiais de futebol tornou-se constante e a cada ocasião, foi-se acalentando o sonho de que seria possível Portugal ganhar uma grande competição, algo que finalmente se cumpriu em 2016, não sem muitas frustrações pelo caminho, em especial em 2004, na final do "nosso" Euro. Pelo que ainda parece tão inacreditável que finalmente milhões de portugueses viram Portugal a levantar o caneco.
Ao longo destes anos, houve algumas canções de apoio à Selecção a cada grande competição, mas nenhuma delas - à excepção da já referida "Força" que apesar das orgulhosamente exibidas raízes lusitanas de Nelly Furtado, não deixava de ser de origem importada - chegou perto da popularidade e genialidade do "Bamos Lá Cambada". Tal continua a ser sucesso que ainda hoje há miúdos que conhecem a canção, para não falar que faz parte da banda sonora da telenovela "Coração D'Ouro", actualmente em exibição na SIC. E como não podia deixar de ser, é essencial no repertório dos espectáculos com que, de há uns anos para cá, Herman José tem percorrido o país a actuar.
Herman José a cantar com Alexandra no programa "Dá-me Música" (2009)
Com os Anjos na Gala Eusébio (2011)
No Natal dos Hospitais (1990):
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