Já falámos aqui há dias dos Jogos Olímpicos de 1984 em Los Angeles, a propósito da primeira maratona feminina olímpica onde Rosa Mota foi uma das ocupantes do pódio. Com a abertura dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro esta semana e a notícia do falecimento do Professor Mário Moniz Pereira, impõe-se um regresso a esses Jogos da 23.ª Olimpíada e recordar aquela que é uma das páginas mais gloriosas do desporto português.
Os Jogos Olímpicos de 1984 foram bastante decisivos para o Movimento Olímpico. Com as últimas edições a serem marcadas por boicotes e outras influências políticas, pesadas facturas financeiras e até mesmo um acto terrorista em 1972, havia cada vez menos interesse em cidades e países acolherem uns Jogos Olímpicos. Aliás, além de um efémero interesse por parte de Teerão, Los Angeles foi a única cidade candidata aos Jogos de 1984, pelo que organizou o evento pela segunda vez, após ter-se estreado em 1932.
Entendendo que a viabilidade económica dos Jogos Olímpicos passava por aí, o comité organizador liderado por Peter Ueberroth desenvolveu várias parcerias com empresas patrocinadoras, como por exemplo a Coca-Cola e a MacDonald's, minimizou os custos de construções das infraestruturas e negociou contractos de direitos de transmissão televisiva. Como tal, os Jogos Olímpicos de Los Angeles foram os primeiros economicamente lucrativos e esse sucesso suscitou as ambições de cidades um pouco por todo o mundo em também serem cidades olímpicas.
Além disso foram os primeiros Jogos onde as portas foram abertas aos atletas profissionais: por exemplo os futebolistas profissionais que nunca disputaram um Mundial de Futebol podiam ser convocados para a selecção olímpica do seu país.
Além disso foram os primeiros Jogos onde as portas foram abertas aos atletas profissionais: por exemplo os futebolistas profissionais que nunca disputaram um Mundial de Futebol podiam ser convocados para a selecção olímpica do seu país.
Em retaliação ao boicote de liderado pelos Estados Unidos aos Jogos Olímpicos de Moscovo em 1980, a União Soviética e os seus países aliados boicotaram os Jogos de 1984, com a notável excepção da Roménia, cuja delegação foi das mais aplaudidas na cerimónia de abertura. Ainda assim, um número recorde de 140 países marcaram presença, incluindo a República Popular de China pela primeira vez desde 1952. Além da maratona, houve pela primeira vez provas exclusivamente femininas no tiro e no ciclismo, bem como a estreia olímpica da ginástica rítmica e da natação sincronizada.
Portugal esteve representado por 39 atletas e obteve em Los Angeles a sua melhor participação olímpica até então, conquistando três medalhas. Tal como Rosa Mota na maratona, António Leitão conquistou a medalha de bronze nos 5000m numa corrida em que ele e Ezequiel Canário dominaram por bastante tempo. Outros bons resultados foram o 6.º lugar de Aurora Cunha nos 3000m e o 7.º lugar de Alexandre Yokochi nos 200m bruços, que se mantém como a única presença de um português numa final olímpica de natação. A única grande decepção foi Fernando Mamede, que semanas antes batera o recorde mundial dos 10000m, mas que mais uma vez cedeu à pressão psicológica que o assaltava em grandes competições e abandonou a corrida.
Portugal esteve representado por 39 atletas e obteve em Los Angeles a sua melhor participação olímpica até então, conquistando três medalhas. Tal como Rosa Mota na maratona, António Leitão conquistou a medalha de bronze nos 5000m numa corrida em que ele e Ezequiel Canário dominaram por bastante tempo. Outros bons resultados foram o 6.º lugar de Aurora Cunha nos 3000m e o 7.º lugar de Alexandre Yokochi nos 200m bruços, que se mantém como a única presença de um português numa final olímpica de natação. A única grande decepção foi Fernando Mamede, que semanas antes batera o recorde mundial dos 10000m, mas que mais uma vez cedeu à pressão psicológica que o assaltava em grandes competições e abandonou a corrida.
António Leitão ganhou a medalha de bronze nos 5000m |
Mas o ponto alto da participação nacional estava marcado para o último dia e para a derradeira prova dos Jogos de Los Angeles. 107 atletas de 59 países apresentaram-se na linha de partida para a maratona olímpica aos 12 dias de Agosto de 1984. Mesmo com o boicote de Leste, o contingente era bastante forte, mas havia três favoritos principais: o australiano Robert de Castella, campeão do mundo em 1983, o japonês Toshihiko Seko que não perdia uma maratona desde 1979 e o americano Alberto Salazar que vencera três vezes consecutivas a maratona de Nova Iorque. Porém nenhum deles chegou às medalhas. (Castella foi quinto, Seko 14.º e Salazar 15.º).
Carlos Lopes, que já tinha uma medalha de prata olímpica em 1976 nos 10000m, tinha então 37 anos e só completara antes apenas uma maratona, a de Roterdão em 1983, onde perdeu apenas para De Castella. Duas semanas antes da sua partida para Los Angeles, Lopes foi atropelado por um Mercedes-Benz quando treinava na Segunda Circular, mas felizmente escapou praticamente ileso. Aos 37km, o português seguia na frente juntamente com o irlandês John Treacy e o britânico Charles Spedding quando desferiu um ataque à liderança que não mais largou. Carlos Lopes cortou a meta ao fim de 2 horas, 9 minutos e 21 segundos, um recorde olímpico que durou até 2008. Treacy foi segundo e Spedding terceiro. A única outra maratona que Lopes venceu foi a de Roterdão em 1985 onde bateu recorde do mundo. Lopes venceu somente duas maratonas na sua carreira, mas que duas!
Charles Spedding (GBR) e John Treacy (IRL) |
Foi portanto em plena cerimónia de encerramento, ao fim de 16 dias de glória em terras californianas, que pela primeira vez um atleta português recebeu uma medalha de ouro olímpica e ouviu-se "A Portuguesa" em solo olímpico. Embora tradicionalmente a cerimónia protocolar da maratona masculina seja a última dos Jogos Olímpicos, Carlos Lopes não foi o último campeão olímpico de 1984 a ser condecorado, pois logo a seguir, numa daquelas patriotices à americana, teve lugar a cerimónia protocolar numa prova de hipismo, ganha por um americano, onde os medalhados entraram montados a cavalo no Coliseu de Los Angeles.
Ao longo dos mais de 42 quilómetros da maratona e no momento de consagração, não foi apenas o Carlos Lopes natural de Vildemoinhos (Viseu) que correu e que subiu ao pódio para receber o ouro, mas sim todo um país então pouco habituado a vitórias, desportivas e não só. Foi também a confirmação dos frutos semeados pelo trabalho do Prof. Mário Moniz Pereira, que como técnico do Sporting, revolucionou o atletismo nacional (para não dizer mesmo o desporto português em geral) e forjou atletas excepcionais como Lopes, Mamede e os gémeos Domingos e Dionísio Castro, provando que com as condições e as orientações certas para treinar e a mescla acertada de talento, disciplina e trabalho duro, os atletas portugueses eram capazes de feitos tão gloriosos quanto os dos outros países. E desde então têm sido vários os atletas nacionais a encher o nosso país de orgulho, nomeadamente em solo olímpico.
Mário Moniz Pereira (1921-2016) |
Momentos finais da maratona masculina:
Paródia à vitória de Carlos Lopes em "Os Simpsons"
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