sexta-feira, 20 de novembro de 2015

"Um Abraço A Moçambique" (1985)

por Paulo Neto

Quando em 1984 as estrelas da música britânica uniram-se para gravar o tema "Do They Know It's Christmas" com o objectivo de angariar dinheiro para combater a fome em África, a ideia depressa estendeu-se a outros países, a começar nos Estados Unidos com o nada menos mítico "We Are The World" e no ano de 1985, parecia que cada país no Mundo Ocidental tinha o seu tema musical all-star visando a mesma causa.





Portugal não foi excepção e em 1985, sob iniciativa da RTP e da RDP, mais de trinta nomes da música portuguesa uniram esforços para gravar "Um Abraço A Moçambique", composto por Pedro Osório, José Mário Branco e José Fanha. O resultado final podia não ter o glamour de "Do They Know It's Christmas" e "We Are The World", mas também foi bastante épico:    





Manuel Freire: Tanta água nos separa, tanta água e basta um passo
Paco Bandeira: P'ra que a morte esconda a cara ao sentir o nosso abraço
Pedro Barroso: Uma ponte assim estendida vai mais longe que os jornais
Tonicha e Raul Indwipo: Rasga o espaço rumo à vida, contra a fome e muito mais
Maria Guinot: Quero ver aí a semente azul da paz

Teresa Silva Carvalho: Água pouca em terra dura quando a seca tira o pão
Helena Isabel: É doença que tem cura num abraço de um irmão
José Mário Branco: Que é do riso dos meninos, que é da música dos pais
Vitorino: Se cantar é meu destino, contra a fome é muito mais
Alexandra: Quero ver aí a semente azul da paz

Sérgio Godinho: Vamos abrir outro mar, fazer a ponte que há dentro do peito
Tonicha e Raúl Indwipo: Dar um abraço que é dado a cantar
Sérgio Godinho e Samuel: E o mar fica assim mais estreito

Todos: Vamos abrir outro mar, fazer a ponte que há dentro do peito
Dar um abraço que é dado a cantar e o mar fica assim mais estreito

Paulo de Carvalho: Tanta água nos separa, tanta água e basta um passo
José Cid: P'ra que a morte esconda a cara ao sentir o nosso abraço
Lena D'Água: Uma ponte assim estendida vai mais longe que os jornais
Lena D'Água e Samuel: Rasga o espaço rumo à vida, contra a fome e muito mais
Luís Represas e Carlos Mendes: Quero ver aí a semente azul da paz

Alexandra, Maria Guinot e Teresa Silva Carvalho:
Vamos abrir outro mar, fazer a ponte que há dentro do peito
Dar um abraço que é dado a cantar e o mar fica assim mais estreito

Todos: Vamos abrir outro mar, fazer a ponte que há dentro do peito
Lena D'Água: Dar um abraço que é dado a cantar
Todos: E o mar fica assim mais estreito

Todos: Vamos abrir outro mar, fazer a ponte que há dentro do peito
Dar um abraço que é dado a cantar e o mar fica assim mais estreito

Além dos nomes acima referidos também participaram nas vozes Rui Veloso, Jorge Palma, Janita Salomé, Júlio Pereira, os restantes membros dos Trovante, o Grupo Terra A Terra e a Brigada Victor Jara. Os músicos eram Guilherme Inês (bateria), José Carrapa (viola), José da Ponte (contrabaixo), João Nuno Represas (percussão), Pedro Osório (teclas) e nos violinos, Alexandre Delgado, Aníbal Lima, Carlos Passos, Filomena Cardoso, Gerardus Holsteyn, Luís Cunha, Lurdes Arvelos, Sónia Carvalho, Tozé Miranda e Vasco Broco. Na altura o videoclip costumava passar todos os dias na RTP após o Telejornal e como tal não tardou até cada português não tivesse o refrão da canção na jukebox mental.

Alguns aspectos que importa referir sobre a música e do videoclip:
- Saúda-se à fuga da regra que implica que os videoclips deste tipo de canções devem ter os artistas com headphones na cabeça.   
- Se no disco da Band Aid tivemos um sobre-excitado Bono Vox a cantar "Well tonight thank God it's them, instead of you" e no dos USA For Africa um Bruce Springsteen a rugir "We are the world, we are the children", aqui Paulo de Carvalho fazia um misto dos dois no verso em que canta.
- Assim como Lena D'Água tem um momento tipo Cyndi Lauper numa das repetições do refrão.
- Rui Veloso executava um dos mais curtos riffs de guitarra de sempre.
- Jorge Palma claramente em modo "I don't give a damn" a segurar efusivamente um chapéu ou com o dito cujo enfiado na cabeça até aos olhos.
- Tenho que concordar com o Nuno Markl quando ao falar desta canção na "Caderneta de Cromos", afirmou que apesar da inegável qualidade dos artistas participantes, havia um défice de juventude (Lena D'Água e os Trovante eram os únicos sub-30) e com tanta veterania, por pouco que este colectivo não parecia mais uma reunião da FENPROF.

E tal como lá fora houve o histórico Live Aid, a auga da nossa campanha nacional foi no dia 24 de Julho de 1985 com um concerto no Coliseu dos Recreios. 


Segundo o livro "A Bíblia dos Anos 80", além das receitas geradas pelos donativos (através da Caixa Geral de Depósitos e dos CTT) e das vendas do disco e dos bilhetes do concerto, foram também enviadas para Moçambique através da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, 20 toneladas de produtos farmacêuticos e cinco contentores com roupa, calçado e brinquedos.

Desde então têm existido ocasionalmente várias gravações de temas nacionais all-star de solidariedade para as mais diversas causas, nomeadamente para as campanhas do Pirilampo Mágico, mas não há como negar que "Um Abraço A Moçambique" foi o tema pioneiro do género em Portugal. No entanto, ao contrário dos já referidos "Do They Know It's Christmas" e "We Are The World", que continuaram a fazer-se ouvir ao longo de todos estes anos, "Um Abraço A Moçambique" foi como que vetado ao esquecimento. Pelo menos eu não me recordo de voltar a ouvir, depois de 1985, a canção até já bem no século XXI.

No programa especial do Réveillon 2007/2008, os Gato Fedorento fizeram uma homenagem/paródia ao tema, numa canção de solidariedade para com os mais famosos vilões históricos e fictícios.



Actualização:
Foto da ocasião publicada no Facebook por João Gil:


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