terça-feira, 24 de julho de 2012

Riscos (1997-1998)

por Paulo Neto

Existem três grandes marcos na teledramaturgia adolescente nacional: o primeiro passo dado com "Os Melhores Anos", essa instituição que dá pelo nome de "Morangos com Açúcar" e, entre essas duas, "Riscos"


Produzida e exibida na RTP entre 1997 e 1998, "Riscos" teve mais de cinquenta episódios, divididos em duas partes que iam para o ar ao sábado e ao domingo ao fim da tarde. Como na altura eu tinha a mesma idade das personagens (17/18 anos), foi uma série que eu e os meus colegas acompanhávamos com curiosidade. Frequentemente nós ríamo-nos do facto da nossa escola não passar nada enquanto na escola da série acontecia tudo e mais alguma coisa. Isto porque a série fez por abordar quase todos os problemas dos adolescentes dos anos 90: sexo, drogas, racismo, anorexia, sexo, skinheads, doenças sexualmente transmissíveis,  alcoolismo, sexo, gravidez, pedofilia, suicídio, sexo, prostituição, homossexualidade, cultos religiosos, sexo, vício no jogo, ecologia, conflitos de gerações e sexo. (Sim, havia muito sexo.) O slogan promocional era "A série que fala a tua língua".



A série passava-se num colégio e seguia as aventuras e desventuras de seis jovens protagonistas, todos eles interpretados por estreantes nestas andanças. Mariana (Ana Rocha) é a marrona da turma que se esforça para manter as aparências e por isso faz vista grossa às infidelidades mal disfarçadas do namorado; Diogo (Fernando Martins) é o rapaz mais cobiçado da escola, pouco preocupado com assuntos sérios e em ser fiel à namorada, embora com o avançar da série ele acabe por se tornar mais responsável e se esforçar para manter o namoro com Mariana; Bruno (Edmundo Rosa), é o mais novo do grupo, ainda no 11.º ano mas com uma rodagem igual à dos amigos; Rita (Sara Gonçalves) é a rebelde da escola mas por detrás da sua imagem de motoqueira intrépida e promíscua, está alguém de grande coração, maturidade e lealdade para com os amigos; André (Frederico Ferreira) partilha a faceta conquistadora de Diogo, mas é mais sério e responsável; Maria João (Paula Neves) é tímida (e virgem) mas acaba por desabrochar graças à amizade improvável com Rita e um curto mas significativo namoro com André.


Sara Gonçalves no papel de Rita



Paula Neves e Alexandra Lencastre, mãe e filha em "Riscos"

No núcleo dos professores estão Margarida (Ana Zanatti), a directora da escola e professora de Inglês, mulher inteligente, firme mas justa; Abel (José Wallenstein), o marido de Margarida e professor de Matemática, que secretamente tenta seduzir as alunas (sendo particularmente obcecado por Rita) e Lídia (Alexandra Lencastre), professora de Português e mãe de Maria João, que tenta refazer a vida em Lisboa depois de um passado conturbado. A meio da série, junta-se também Pedro (Diogo Infante), o professor de Filosofia, que após muitos contratempos, acaba com Lídia.

Além disso, a série teve várias participações especiais de nomes conhecidos, alguns até sem ser da área da representação. Só para nomear alguns: Julie Sargent, Cristina Carvalhal, Bárbara Elias, Margarida Marinho, João Pedro Pais, Maria Elisa, António Feio, Vítor Norte e o actor brasileiro Luigi Palhares, que os portugueses conheciam da telenovela "A Próxima Vítima". Também alguns jovens actores conhecidos do público tiveram aqui um dos seus primeiros trabalhos televisivos, desempenhando papéis secundários como Hugo Sequeira, Susana Arrais, Alda Gomes, Ivo Canelas, Nuno Lopes, Márcia Leal, Nuno Távora e Paulo Rocha.
Queria destacar também duas personagens secundárias recorrentes. Ulisses, uma das primeiras personagens homossexuais da ficção nacional, interpretada por Pedro Cunha, que recentemente fez-se notar em "Rosa Fogo". A outra é Daniela, uma personagem muito atribulada, pois começa na cama com o professor Abel em troca dos enunciados dos exames, envolve-se num culto religioso neo-hippie e chega a fazer Ulisses a duvidar brevemente da sua orientação sexual. Esta personagem foi encarnada por Marta Furtado (irmã de Catarina) naquele que foi o seu mais notado trabalho em televisão, já que tem feito carreira essencialmente no teatro.

"Riscos" foi criticada pela inverosimilhança das histórias (como já disse, naquela escola acontecia de tudo), pela montagem cheia de mudanças aceleradas de plano, pela realização por vezes desnorteada, pelo alegado amadorismo das interpretações e sobretudo, pelo excesso de sexo. De facto, dava a sensação que quase todas as personagens, adultas ou adolescentes, tinham ido para a cama umas com as outras. Por exemplo, Maria João começou a série virgem mas acabou com um currículo sexual assinalável. E o facto de logo numa das primeiras cenas do primeiro episódio, termos logo Rita a mostrar os seios, adivinhava-se logo que a série iria primar pelo tom badalhoco.
As críticas têm o seu fundamento mas tal não incomodou o público, sobretudo adolescente, que soube acompanhar a série como puro entretenimento e minimizar os excessos. Ou então, como refere Hugo Silva, autor do blogue "Ainda Sou do Tempo", era mais um daqueles casos de "tão mau que dá a volta e fica bom". E tal como acontece com várias séries e filmes filhos do seu tempo, a série acabou por beneficiar do célebre efeito cápsula onde muito do espírito dos anos 90 foi capturado. 

Após a série, as protagonistas femininas tiveram carreiras bem mais significativas que os masculinos. Paula Neves foi de longe a mais bem-sucedida tendo desde então entrado em diversas telenovelas e algumas séries e filmes, destacando-se obviamente o mítico papel da Mariana "Trinca-espinhas" em "Anjo Selvagem". Ana Rocha foi também presença assídua em séries e telenovelas mas desde "Jura" que anda afastada da televisão, dedicando-se mais a estar do outro lado da câmara: realizou um documentário sobre Adriano Correia de Oliveira e diversos showcases musicais. Sara Gonçalves tem apostado mais no teatro mas tem feito esporadicamente alguns trabalhos em televisão, sendo o mais notado o papel da falsa cega em "Floribella".
Já dos três rapazes pouco se tem visto ou falado deles. Frederico Ferreira acabou por não enveredar por uma carreira de actor. Só voltei a rever Edmundo Rosa nos "Malucos do Riso" e na telenovela "Baía das Mulheres". E Fernando Martins, cuja pinta de galã in the making fazia-me vaticinar que podia ser o Ricardo Carriço da sua geração, só apareceu de novo no pequeno ecrã como apresentador do "Hugo" (substituindo Pedro Pinto) e na série "Alves do Reis".



Um álbum com a banda sonora da série foi também editado, contendo temas de artistas portugueses como Pedro Abrunhosa, Raul Marques & Os Amigos da Salsa, Primitive Reason, Black Out ou Cool Hipnoise e outros internacionais como James, Texas, The Cardigans e Brand New Heavies. O tema da série era interpretado por duas vozes da cena musical nacional dos anos 90: Kika Santos, na altura nos Black Out e Sam, que cantou no tema "Black Magic Woman" e numa conhecida versão dance de "Estou além" de António Variações. Ambos apareceram a cantar o tema no último episódio.

Genérico da série:








Excertos de episódios:



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Em memória de Pedro Cunha (1980-2014)

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10 comentários:

  1. Esta foi uma série que gostei bastante de ver e até a achei na altura uma produção importante.
    Tenho a ideia que a segunda temporada foi exibida durante a semana, no horário nobre (salvo erro à Quarta à noite) e sim, a segunda temporada foi mais fraquinha que a primeira por querer fazer demasiado. Na verdade a ideia que o texto transmite de "Riscos" parece-me corresponder mais à segunda temporada que à primeira (que foi bob e uma verdadeira pedrada no charco televisivo dos anos 90).
    Uma das actrizes que mais admirava na série era a Ana Rocha... que voltou à TV para aparecer na ainda melhor série "Jura". ^_^

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    1. Pelo que me recordo, os Riscos só teve uma única série. O que sucedeu foi que mesmo antes da estreia, a RTP encomendou logo mais episódios para além daqueles que já estavam prontos, mas todos foram exibidos sem hiatos.

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  2. Mas notou-se, e falo por memória, de dois níveis diferentes na série. A inocência de desbravar caminho com situações que apoquentam os jovens deu-se numa série de episódios (1ª temporada) que tentava chegar ainda assim definir-se, ao passo que depois se notou uma maior ambição de os temas serem mais abrangentes e ao mesmo tempo continuados em arco narrativo por vários episódios -numa tomada mais telenovelesca- (recordo-me de casos como a situação da SIDA de uma das personagens...), e esses foram os episódios da segunda temporada. Que talvez sim, tenham sido exibidos mais ou menos continuamente. Recordo-me que quando a série Riscos passava na grelha da RTP, foi numa fase de mini-revolução da grelha no horário nobre. A RTP tinha abandonado o conceito de telejornal, novela e programa de entretenimento, para algo ligeiramente diferente onde a seguir ao telejornal, deixou de ter novelas (salvo erro) para passar a exibir concursos/debates/informação e a seguir uma série diferente diariamente (à segunda era uma brasileira, "A Justiceira", à terça o Herman Enciclopédia salvo erro seguido da magnifica Ballet Rose, à quarta Riscos, à Quinta e Sexta não me recordo porque acho que nem via com atenção para ver outras coisas na TVI ou SIC, que eram ainda estações novatas e irreverentes por vezes)

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  3. Se "Os Melhores Anos" foi um primeiro passo e "Riscos" o segundo (grande série), então O "Morangos com Açucar" foi o passo para cair no abismo, de tão mau que era (O "Rebelde Way" era já caso de estar em coma terminal).

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    1. Os Morangos até tiveram algumas temporadas decentes. Esse Rebelde Way, o I Love It e a Lua Vermelha já estavam para lá de mortos e a cheirar mal :D

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    2. Pelo menos a primeira temporada dos Morangos eu arrisco a dizer que foi bem melhor que os Riscos. Mas eu de Riscos não me lembro bem, mas já vi algumas coisas no YouTube. Gostei de ver Rebelde Way e Lua Vermelha.

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  4. olá procuro desesperadamente a série completa de riscos, vhs, dvd, download, ocasião ... você poderia me ajudar?
    Sou do sul da França e é ainda mais complicado encontrar sem estar em Portugal

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  5. Gostava de voltar a ver. A RTP memória podia lembrar-se desta série!

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    1. Segundo consta, a RTP Memória não pode exibir a série porque os direitos eram todas da produtora FIT que acabaria por dissolver sem delegar os direitos da série à RTP ou a outra entidade. (Ao contrário de outra série da produtora, O Diário De Maria, que a RTP Memória tem reexibido várias vezes.)

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    2. Desconhacia totalmente deste triste facto, mas muito obrgado pela informação

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