Se me dissessem ao meu eu antes de 2002 que uma das minhas séries favoritas de sempre seria sobre uma família de cangalheiros, eu rolaria os olhos em descrédito. Mas quando a RTP2 passou a exibir a partir desse ano a série "Sete Palmos Da Terra", rapidamente fiquei viciado e mais de quinze anos após o seu fim, mantém um lugar cativo entre as séries da minha vida. No original "Six Feet Under", a série foi criada por Alan Ball, recém-consagrado como argumentista do oscarizado filme "Beleza Americana" e teve 63 episódios repartidos por cinco temporadas, exibidas nos Estados Unidos entre 2001 e 2005 e em Portugal na RTP2 entre 2002 e 2006 às segundas-feiras à noite. Como o título deixava antever o tema principal é a morte, mas também reflectia sobre as relações humanas, sobretudo as familiares.
A série acompanhava a família Fisher, proprietária de uma agência funerária em Los Angeles, após a morte do patriarca, Nathaniel Fisher Sr. (Richard Jenkins), inesperadamente falecido na véspera de Natal de 2000. Aliás, começando pelo seu óbito, cada episódio começava com uma sequência onde assistimos à morte de alguém, geralmente o próximo defunto "cliente" da Fisher & Sons, terminando com o nome e os anos de nascimento e morte da pessoa. Ao longo dos vários episódios estes óbitos foram bastante variados, alguns de forma cómica, outros de forma trágica, com defuntos de várias idades e posições sociais.
Os membros da família Fisher são a matriarca, Ruth (Frances Conroy); o filho mais velho Nate (Peter Krause), o filho pródigo que com a sua vida um pouco à deriva decide deixar Seattle e assumir o negócio da família; David (Michael C. Hall), o filho do meio que ao início se debate com a sua homossexualidade reprimida, e a filha mais nova Claire (Lauren Ambrose), uma adolescente rebelde. Além deles, existem mais três personagens principais: Federico Diaz (Freddie Rodriguez), o funcionário hispânico da Fishers & Sons, Keith Charles (Matthew St. Patrick), o polícia negro que começa como um caso secreto de David mas com quem eventualmente assume a relação e Brenda Chenowith (Rachel Griffiths), uma mulher que tenta esquecer o seu passado problemático com quem Nate tem uma relação com vários altos e baixos.
Ao longo da série, acompanhamos estas sete personagens, pelos seus altos e baixos, pelas suas decisões acertadas e outras assaz estúpidas, e a sua formas de encarar a vida, a morte e as suas relações com os outros. Frequentemente, existiam algumas sequências onde elas "conversam" com alguns dos mortos, como o Nate sénior ou outros defuntos em busca de respostas, ou que ilustram os seus sonhos e/ou alucinações. Ruth, cuja vida foi marcada pela repressão, tenta refazer a vida e repensar na sua identidade para além de esposa e mãe. Na primeira série, vê-se num triângulo amoroso com Hiram (Ed Begley Jr.), um cabeleireiro com quem ela estava a ter um caso, e Nikolai (Ed O'Ross), um florista russo. Na quarta temporada casa-se com George (James Cromwell) um geólogo, cujo passado insiste em lhe perseguir.
Uma vez assumida a sua homossexualidade, David vai-se descobrindo cada vez mais pessoalmente e, após vários avanços e recuos, a sua relação com Keith acaba por prosperar e terminam a série adoptando dois irmãos órfãos, Durrell e Anthony. Claire descobre um talento para as artes plásticas e vai navegando por algumas relações problemáticas, sobretudo com Billy (Jeremy Sisto), o irmão de Brenda com um grave distúrbio bipolar. O casamento de Rico com Vanessa (Justina Machado) passa por várias tensões, desde problemas com outros membros da família a infidelidades, mas quando tudo parece irremediável, no fim os dois voltam a entender-se. Além dos altos e baixos da relação com Nate, Brenda tenta reconciliar-se com o passado, como a negligência dos pais, o apego semi-incestuoso do irmão e uma infância onde a sua inteligência sobredotada foi caso de estudo de vários psicólogos e relatada num livro famoso. E Nate descobre que tem um problema de saúde potencialmente fatal, uma malformação arteriovenosa, que lhe faz confrontar-se com a sua mortalidade. A meio da última temporada, um problema semelhante acaba por ser fatal e a recta final da série é dedicada à maneira como as restantes personagens principais lidam com a perda de Nate, sobretudo Brenda, que espera um filho dele.
Além das personagens já referidos, há que mencionar ainda Sarah (Patricia Clarkson), a irmã artística e liberal de Ruth, por quem esta sempre sentiu um misto de ressentimento e inveja, Lisa (Lili Taylor) uma amiga de Nate de Seattle com quem ele casa e tem uma filha, Maya, no início da terceira temporada mas que desaparece e é encontrada morta no final da dita, Margaret (Joanna Cassidy), a egocêntrica mãe de Brenda e Billy, e Joe (Justin Theroux), com quem Brenda namora durante a quarta temporada.
A série contou ainda com participações especiais de nomes como Kathy Bates (que também realizou dois episódios), Rainn Wilson, Michelle Tratchenberg, Mena Suvari, Ricardo Antonio Chaviria, Eric Balfour, Ileana Douglas, Catherine O'Hara, Peter Facinelli, Sandra Oh e Ben Foster.
Para mim, existem dois episódios da série que me marcaram profundamente. Um deles foi o quinto da episódio da quarta temporada, "That's My Dog", onde David sofre às mãos de Jake (Michael Weston) a quem dera uma boleia na carrinha da agência, sendo brutalmente agredido e amarrado, obrigado a fumar crack e quase morto. (Escusado será dizer que essa experiência vai deixar-lhe marcas traumáticas para o resto da série.) Quando terminou esse episódio, eu estava completamente destroçado e em lágrimas, como se eu também tivesse passado pelos mesmo tormentos que David.
O outro foi o último episódio, "Everyone's Waiting", o único que começa não com uma morte, mas com um nascimento, o de Willa, a filha de Nate e Brenda. David e Keith compram a parte da agência de Rico, que quer ter o seu próprio negócio, e mudam-se para a casa da família Fisher com os dois filhos. Separada de George desde que este revelou problemas de demência, Ruth decide ir viver com a irmã. Brenda aceita um emprego como professora e investigadora do desenvolvimento de crianças sobredotadas. Claire tem uma proposta de emprego como assistente de um fotógrafo em Nova Iorque e apesar de entretanto essa proposta ficar sem efeito, encorajada pelo espírito de Nate, ela decide partir na mesma. Durante a sua viagem de carro, ao som de "Breathe Me" de Sia, vemos vários flash-forwards sobre os momentos finais das vidas dos protagonistas: Ruth morre de causas naturais em 2025, Keith morre alvejado em 2029, David de ataque cardíaco em 2044, Rico também de enfarte em 2049 durante um cruzeiro com Vanessa, Brenda durante uma conversa com Billy em 2051 e Claire morre de velhice aos 102 anos em 2085. Ainda hoje é considerado um dos melhores episódios finais de sempre de uma série televisiva e também fiquei destroçado no fim deste episódio mas da melhor maneira possível.
"Sete Palmos de Terra" recebeu nove Emmys, três Globos de Ouro e três prémios SAG e é considerada, juntamente com outras séries que estrearam pela mesma altura como "Os Sopranos" e "24", como uma das série responsáveis pelo início da elevação das séries televisivas como produto de ficção de excelência equiparável ao cinema.
Grande série, também das minhas preferidas de sempre. Além do último episódeo o que mais me marcou foi aquele em que o Nate enterra a Lisa. Não me lembro se é o final da temporada 3 ou inicio da 4.
Grande série, também das minhas preferidas de sempre. Além do último episódeo o que mais me marcou foi aquele em que o Nate enterra a Lisa. Não me lembro se é o final da temporada 3 ou inicio da 4.
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