domingo, 7 de março de 2021

Festival da Canção 1991

por Paulo Neto

Tempo para recordar mais uma edição do Festival da Canção, desta vez recuando trinta anos até à edição de 1991, que se realizou nas antigas instalações da FIL. Como era habitual, o Festival teve lugar a 7 de Março, o dia de aniversário da RTP.



A apresentação esteve a cargo de Júlio Isidro e Ana Paula Reis e o tema da edição foi o cinema português. Antes da apresentação de cada canção foi apresentado um excerto de um filme português dos anos 30/40 e entre o desfile das canções e as votações, houve uma medley de canções do cinema português onde participaram António Pinto Basto (cantando "O Fado Do Estudante" de "A Canção De Lisboa"), Marina Mota (cantando "Cantiga Da Rua" de "O Costa Do Castelo), Lena D'Água (com "Sonhos De Amor" de "A Menina da Rádio), Luís Filipe, Nucha, Olívia e Paulo de Carvalho.  

Nesse ano as oito canções foram selecionadas pelo convite da RTP a quatro editoras (Discossete, EMI, Namouche e Ovação), cada qual submetendo duas canções ao concurso. Vamos recordá-las pela ordem inversa à classificação.


Em último lugar, ficou precisamente a última canção a actuar, "Com Muito Amor" interpretada por Emanuel. Sim, esse Emanuel. De seu verdadeiro nome Américo Monteiro, já levava uma década no mundo da música, como produtor e compositor, atravessando diversos géneros (como por exemplo o synth-pop, no projecto Flash que em 1982 editou o single "Música Electrónica") e em 1991 dava os seus primeiros passos como cançonetista, usando o célebre stagename. Escusado será dizer que anos mais tarde, a carreira de Emanuel explodiu, sobretudo em 1995 quando lançou a canção que daria o termo utilizado para explicar o estilo de música sob o qual se albergaram sonoridades da música popular portuguesa, da música brejeira e do antigo nacional cançonetismo: a música pimba, que foi toda uma perfect storm no panorama musical português. Porém na altura Emanuel ainda estava a alguns anos da sua consagração e a canção que cantou ficou na cauda da tabela com 38 pontos. A actuação teve ainda a particularidade de ter em palco dois bailarinos de danças de salão dos Alunos de Apolo.     


Em sétimo lugar ficou a canção n.º 6 "Sem Adeus", cantada por Paula Monteiro e Pedro Chaves. Paula Monteiro tinha tido alguma notoriedade em 1986 ao ser a voz e a cara do projecto Spunky que editou o single "Latino Americano", com o qual actuou em alguns programas de televisão como por exemplo o "Clube Amigos Disney", onde a certa altura apareceu o Zé Carioca para dançar com ela. "Sem Adeus" era uma balada romântica mas as vozes de Pedro Chaves e Paula Monteiro não conjugavam muito bem, daí o penúltimo lugar com 67 pontos.

Tal como Emanuel, Toy é hoje um household name. Mas na altura, o artista nascido com o nome de António Ferrão ainda estava no início da sua ascensão. Toy tinha-se iniciado na música quando esteve emigrado na Alemanha integrando vários grupos, regressando a Portugal em meados dos anos 80 dividindo-se entre compor para outros intérpretes e gravar as primeiras canções como solista. Toy era o único repetente desta edição no Festival da Canção, tendo participado no ano anterior com "Mais E Mais", tendo ficado em terceiro lugar e recebido o prémio de interpretação. Já com esta canção, n.º 2, "E Até Quando?", falando de temas mais sérios, não foi além do sexto lugar com 75 pontos (com a pontuação máxima do júri de Évora). Mas este seria apenas um mero fait divers na carreira de Toy que não tardaria a acumular sucessos. 

Além da canção que o próprio interpretou, Emanuel também escreveu a canção n.º1, "No Teu Sorriso" para a voz de Mariel. Pouco ou nada mais se sabe sobre Mariel, que acusou o nervosismo na sua actuação, mas ainda assim a sua canção superaria a do seu mentor, ficando em 5.º lugar com 85 pontos.


A canção n.º 3, "Bye, Lili, Bye" foi interpretada por T&Gus, que é como quem diz, Tó Leal e Gustavo Sequeira. No início dos anos 90, estes dois cantores eram requisitadíssimos para vários trabalhos, desde espectáculos musicais a genéricos de programas e jingles publicitários e já tinham participado anteriormente no Festival, Sequeira em 1985 e Leal em 1988. Não esquecer que Gustavo Sequeira é voz que nos cantou "Selvagem, uma dentada em Lion" e "Gilette, o melhor para o Homem" e que eles os dois, juntamente com Nucha e uma senhora da qual se falará mais adiante, cantariam o hino da SIC no ano seguinte. E tal como essa mesma senhora da qual se falará mais adiante, Tó Leal era um dos cantores residentes do programa "Regresso Ao Passado" conduzido por Júlio Isidro e que na altura ia para o ar na RTP1 nas tardes de Domingo. A canção que os dois defenderam foi sem dúvida a mais bem-disposta e descontraída das oito a concurso e continha uma ilustre surpresa em palco: entre aqueles que acompanhavam Tó e Gustavo, estava nada menos que a lendária Ruth Rita de "A Roda Da Sorte" atrás de um teclado! A certa altura, Tó Leal aproximou-se dela e Ruth deu-lhe um beijo marcando a face dele com batom. No final, "Bye, Lili, Bye" ficou em quarto lugar com 126 pontos. 


E chegamos ao pódio, e em terceiro lugar ficou a canção n.º 7 "Te Amo E Não Pensei", na voz de Carla Sofia. Segundo o livro "Portugal, 12 Pts. - Festival da Canção", Carla Sofia tinha-se participado em 1990 na revista "A Grande Festa" que marcou a reabertura do Teatro Variedades no Parque Mayer. A sua canção, uma das mais mexidas a concurso, obteve 146 pontos (incluindo a pontuação máxima do meu distrito, Santarém), vindo a ser incluída no seu álbum "Amor Exagerado" editado pela Discossete (sendo esta uma das duas canções submetidas por essa editora no certame) no ano seguinte. 



Em segundo lugar, temos a canção n.º 4, "Fazer Uma Canção", interpretada pelo grupo Blocco composto por Carla Burity, Fernanda Lopes, Luísa Fumaça, Octávio de Sousa, Paulo Brissos e Ricardo Carriço. Sim, esse Ricardo Carriço, que não tardaria a afirmar-se como actor. Paulo Brissos também participaria a solo no Festival de 1993 e o seu álbum de 1997 "A Criação" teve alguma notoriedade, sobretudo com o tema "Serás Tu", enquanto Fernanda Lopes, além de concorrer a solo no Festival de 1994, foi cantora de coro em sete participações de Portugal na Eurovisão e alternou com Lúcia Moniz como a voz feminina na banda residente do programa "Não Se Esqueça Da Escova De Dentes". De referir ainda que esta foi a primeira participação de Rosa Lobato Faria como letrista no Festival da Canção, sendo mais tarde a autora da letra de quatro canções vencedoras nos anos seguintes. "Fazer Uma Canção" obteve 155 pontos, menos onze que a canção vencedora, que era a favorita indiscutível. 



Efectivamente, seria quase impensável haver outra canção vencedora no Festival da Canção de 1991 que não a canção n.º 5 de seu título "Lusitana Paixão", na voz de Dulce Pontes, escrita por José da Ponte, Jorge Quintela e Fred Micaelo. A cantora natural do Montijo já era uma cara conhecida do público. Começou no teatro, cantou para jingles publicitários e genéricos de programas (como a versão portuguesa da série animada "A Ilha Do Tesouro") e era uma das cantoras residentes do programa "Regresso Ao Passado" de Júlio Isidro, então em exibição na RTP1. Mas sem dúvida que a vitória no Festival foi o seu primeiro grande momento áureo numa carreira que a tornaria numa das cantoras portuguesas mais reconhecidas internacionalmente. Além da vitória, Dulce Pontes venceu também o prémio de interpretação e realmente "Lusitana Paixão" foi uma canção que demonstrava perfeitamente todo o seu talento. 



No igualmente mágico e caótico Festival da Eurovisão desse ano em Roma, Dulce Pontes obteria o oitavo lugar, o primeiro top 10 de Portugal desde 1980 e ainda hoje um dos nossos melhores resultados eurovisivos. Em 1994, por alturas do 30.º aniversário do Festival da Canção, a RTP promoveu uma votação pública para a melhor canção vencedora de sempre e "Lusitana Paixão" foi a vencedora destacada. Ainda em 1991, Dulce Pontes representou Portugal no Festival da OTI, com "A Sul Da América" que tal como "Lusitana Paixão" viria a ser incluída no seu primeiro álbum "Lusitana" de 1992, ano onde juntamente com Tó Leal, Gustavo Sequeira e Nucha empresta a voz ao hino da SIC. Mas seria o álbum seguinte "Lágrimas" de 1993, que conheceria um sucesso sem pretendentes aquém e além fronteiras. Seguiram-se também "A Brisa Do Coração" (1995), "Caminhos" (1997) e "O Primeiro Canto" (1999) bem como a colaboração com Ennio Morricone no disco "Focus" (2003) que incluía "O Amor A Portugal".  

Versão em inglês:


Videoclip



O agradecimento ao site Festivais Da Canção e a João Carlos Calixto e Jorge Mangorrinha, autores do livro "Portugal, 12 Pts. - Festval da Canção". 

O Festival da Canção de 1991 está disponível para visualização na RTP Arquivos.
Parte 1: atuações das oito canções concorrentes
Parte 2: intervalo entre-actos dedicado ao cinema português 
Parte 3: votações. entregas de prémios e reprise da canção vencedora

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2 comentários:

  1. A Paula Monteiro foi também corista da Nucha em Zagreb 1990 além da Carla Burity, do José Carvalho na bateria, do Octávio de Sousa nas teclas e da Fernanda Lopes.
    O autor da letra de Lusitana paixão não é Fred Micael mas Fred Micaelo (do seu nome verdadeiro Alfredo José Magina do Rosário).

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  2. A Paula Monteiro intérprete de "Sem Adeus" é outra cantora diferente da Paula Monteiro que fez coros para a Nucha em 1991 e que também fez coros aqui nos temas da Mariel e do Emanuel. :)

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