quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Festival da Eurovisão 2001

 


O 46.º Festival da Eurovisão da Canção teve lugar a 12 de Maio de 2001 no Estádio Parken em Copenhaga na Dinamarca, após a vitória desse país no ano transacto. O estádio, considerado como uma das catedrais do futebol dinamarquês (tendo por exemplo acolhido alguns jogos do Euro 2020), tinha uma cobertura retráctil e as suas dimensões proporcionaram que este fosse a edição do Festival da Eurovisão com a maior audiência de sempre com 38 mil espectadores. 

Porém, devido aos custos de organizar o espectáculo num recinto daquelas dimensões, certamente não terá havido orçamento suficiente para a iluminação, por que a sensação que dava é que estava muito escuro no estádio e alguns do espectadores nem conseguiam ver bem o palco, que por sua vez notava-se não ter iluminação suficiente e ser grande demais para algumas das actuações. Os apresentadores foram Soren Pilmark e Natasja Crone-Back que tiveram a particularidade de falarem quase sempre em rima. Um dos momentos mais caricatos foi quando os apresentadores mostraram o troféu a ser entregue ao vencedor, gerando-se um burburinho quando Pilmark pegou desajeitadamente no troféu e deixou-o cair no chão, estilhaçando-se todo. Mas tudo não passou de uma brincadeira e o verdadeiro troféu foi parar intacto às mãos do vencedor. 
A actuação de intervalo esteve a cargo dos Aqua, que cantaram uma medley dos seus hits (com uma Lene Nystrom inesperadamente asneirenta na parte de "Barbie Girl"), acompanhados pelo Safri Duo, a dupla percussionista cujo tema "Played-A-Live" fazia furor nas pistas de dança da altura.  

Após a ausência no ano anterior devido às regras de relegação, Portugal voltava a participar bem como Bósnia-Herzegovina, Eslovénia, Grécia, Lituânia e Polónia, ao passo que Áustria, Bélgica, Chipre, Finlândia, Macedónia, Roménia e Suécia ficaram de fora devido aos baixos resultados do ano anterior. 
Os votos de dezassete dos 23 países participantes vieram do televoto, enquanto Bósnia-Herzegovina, Rússia e Turquia optaram por um júri e Croácia, Grécia e Malta um método 50% de cada. Eládio Clímaco assegurou os comentários para a RTP e Margarida Mercês de Melo foi a porta-voz dos votos de Portugal. 

Como é hábito analisaremos as canções concorrentes por ordem inversa da classificação.

Haldor Lagreid (Noruega)


Two Tricky (Islândia)


O último lugar foi repartido pela Noruega e a Islândia com três pontos. Um nome consagrado no teatro musical norueguês, Haldor Lagreid cantou deu interpretação dramática de "All By Myself" "On My Own" e os telespectadores cá do burgo devem ter gostado, pois os três pontos da Noruega vieram de Portugal. Já a Islândia recebeu 1 ponto da Noruega e 2 da Dinamarca, representada pelo duo Two Tricky com "Angel", um tema pop bastante simpático mas não muito memorável. Ao que parece, uma polémica na final nacional islandesa devido ao regulamento imposto pela TV local que obrigava que todas as canções fossem cantadas em islandês e a contestação de vários artistas de poderem escolher o idioma que queriam chegou até a ser debatido no Parlamento. Por fim, o duo composto pro Kristjan Gislasson e Gunnar Olsson cantou em inglês (a versão islandesa tinha como título o nome feminino "Birta") mas de pouco lhes serviu.

Gary O'Shaughnessy (Irlanda)

Piasek (Polónia)


Com cinco pontos do Reino Unido e um de Portugal, a Irlanda ficou-se pelo 21.º lugar, naquele que era na altura o pior resultado de sempre do país com mais vitórias na Eurovisão. Gary O'Shaugnessy cantou a balada "Without Your Love" mas este registo que valera tantas vitórias à Irlanda no passado já estava datado. Curiosamente o seu sobrinho Ryan foi o representante irlandês na edição de 2018 em Lisboa.
A Polónia apostou num dos seus cantores mais populares, Andrzej Piaseczny ou simplesmente Piasek, com o tema "2 Long", mas ficou-se pelo 20.º lugar com onze pontos. O look não ajudou já que ele surgiu em palco envergando um casaco de pele cuja tecelagem parecia abruptamente interrompida (valendo-lhe o prémio de Barbara Dex) e que a meio da actuação jogou para o chão. Além disso, as cantoras de coro vestidas como odaliscas também não encaixavam no estilo da canção. A par da sua carreira na música, Piasek entrou de 1997 a 2010 numa série de televisão, onde fazia de… cantor.

Michelle (Países Baixos)

 
Arnis Mednis (Letónia)

Os Países Baixos e a Letónia ficaram ambos em 18.º lugar com 16 pontos. Coube à representante holandesa Michelle ser a primeira a actuar com a balada new age "Out On My Own" e parecia que ela vinha de dar uma aula de ioga. Porém, Portugal aprovou e foi o país que deu mais pontos aos Países Baixos, seis. Actualmente Michelle Courtens é professora de canto.
Depois de uma auspiciosa estreia no ano anterior, em que conseguiu o terceiro lugar, desta vez a Letónia teve uma prestação mais modesta. Arnis Mednis cantou "Too Much", um tema que bem podia ter pertencido aos Rednex. Porém, no ano seguinte, as coisas correriam pelo melhor à Letónia.  

MTM (Portugal)

Portugal foi representado pelo duo MTM (Marco, Tony e Música), composto por Marco Quelhas e Tony Jackson. Este era natural de Angola, tendo vindo para Portugal para estudar medicina. Já Marco Quelhas tinha tido algum êxito como vocalista da banda Karamuru e durante a década de 90, tentou a sua sorte várias vezes no Festival Da Canção, mas até então só vencera como co-autor da canção vencedora de 1993, "A Cidade (Até Ser Dia)" de Anabela. 
O Festival da Canção de 2001 foi o mais extenso até então, com cinco semifinais (a primeira delas ainda em Outubro de 2000) de dez canções cada em cinco cidades diferentes (Setúbal, Leiria, Faro, Funchal e Ponta Delgada). As duas primeiras canções de cada semifinal apuraram-se para a grande final que decorreu no Europarque de Santa Maria da Feira a 7 de Março de 2001. No entanto, devido à tragédia da queda da Ponte de Entre-Os-Rios três dias antes, a final não foi transmitida em directo, sendo exibida uns dias mais tarde. Entre os nomes mais sonantes que participaram, destaco Lura, Mónica Ferraz e Ana Laíns, assim como Mané Crestejo e Rosete Caixinha que nos próximos anos ficariam conhecidos por participações em programas de talentos. 
Contudo a meu ver, quantidade não significou qualidade, e o nível geral das canções foi pouco elevado. A canção vencedora "Só Sei Ser Feliz Assim" não era excepção, sendo um tema simpático mas já datado e será porventura a menos lembrada de todas as nossas canções eurovisivas. Portugal foi o último país a receber pontos mas com a diáspora portuguesa a mobilizar-se, Portugal recebeu 12 pontos da França e mais seis da vizinha Espanha e ficou-se pelo 17.º lugar.
Este resultado significou uma nova relegação e Portugal não participaria no Festival de 2002. No entanto, a história poderia ter sido diferente. Isto porque para a edição de 2002, a EBU decidiu alargar o número de países participantes para 24 e sobrando duas vagas, convidou os primeiros dois países de entre os relegados, Israel e Portugal. A televisão israelita aceitou mas a RTP, a braços com problemas  administrativos e financeiros, declinou e a vaga passou para a Letónia que aceitou… e não é que ganhou nesse ano?´

Tal Sondak (Israel)


Lindsay Dracass (Reino Unido)


Nesta edição, apenas três países não recorreram, inteira ou parcialmente, ao inglês para as suas canções: Portugal, Espanha e Israel, que ficou em 16.º lugar com 25 pontos (incluindo um 10 da França). Tal Sondak cantou "En Davar" ("não importa") um tema com alguns toques latinos, mas foi um pouco prejudicado pelos cantores de coro que não estiveram muito bem afinados.
O Reino Unido foi representado pela jovem Lindsay Dracass, de 16 anos com o tema dance-pop "No Dream Impossible" que ficou em 15.º lugar com 28 pontos. Apesar deste ser o seu único momento de notoriedade, Lindsay continuou ligada à música e mais recentemente foi um dos cem jurados do "All Together Now" britânico. 

Nino (Bósnia-Herzegovina)

SKAMP (Lituânia)


Será que Nino Prses pediu emprestadas algumas roupas ao Pedro Abrunhosa, incluindo um dos seus pares de óculos? Depois de ter integrado várias bandas, Nino dava os seus passos como artista a solo e representou a Bósnia Herzegovina com o tema "Hano" onde cantava o seu amor a uma Hana. Ficou em 14.º lugar com 29 pontos. 
Depois de 1994 e 1999, a Lituânia participou pela terceira vez, com o grupo Skamp e o tema funk-disco "You Got Style", ficando em 13.º lugar com 35 pontos. O trio tinha-se formado em 1998 e era composto por Vilius Alesius, Erica Jennings, natural da Irlanda, e Victor Diawara, de ascendência malinesa. Em 2006, Diawara integrou o grupo LT United que obteve o melhor resultado da Lituânia até ao momento, um sexto lugar, com o rotundo "We Are The Winners".

Mumiy Troll (Rússia)

Sedat Yuçe (Turquia)

Vanna (Croácia)


A Rússia foi representada pela banda rock Mumiy Troll, activa desde 1983 e liderada desde sempre pelo vocalista Ilya Lagutenko. Com "Lady Alpine Blue" obtiveram o 12.º lugar com 37 pontos
Sedat Yuçe foi o representante da Turquia com a balada "Sevgiliye Son" ("o fim do amor"), que lhe valeu 41 pontos e o 11.º lugar.
Ivana Ranilovic-Vrdoljak, ou simplesmente Vanna, foi a representante da Croácia com "Strings Of My Heart", um tema que fazia lembrar um pouco a música de "O Barco Do Amor", alcançado o décimo lugar com 42 pontos. Entre a vitória na pré-selecção croata e a participação eurovisiva em Copenhaga, Vanna deu à luz uma filha!  

Fabrizio Faniello (Malta)

Michelle (Alemanha)


Graças aos 12 pontos da Dinamarca, o último país a votar, Malta saltou do 13.º para o nono lugar. Fabrizio Faniello cantou "Another Summer Night", um tema de latin-pop. Graças a esta participação, Faniello conseguiu obter alguma notoriedade fora do seu país, sobretudo com o seu single de 2004, "The Whistle Song (I'm In Love)". Em 2006, voltou a representar Malta no Festival da Eurovisão com "I Do" mas desta vez ficou no último lugar da final. A sua irmã Claudia também representaria o país em 2017.
Tal como os Países Baixos, a Alemanha fez-se representar por uma Michelle. Mas se a Michelle holandesa era mesmo Michelle, no caso da Michelle alemã, era o stagename de Tanja Hewer que cantou a balada "Wer Liebe lebt" ("quem vive o amor") na versão bilingue em alemão e inglês. A canção alemã ficou em oitavo lugar com 66 pontos (com Espanha e Portugal a darem 10 pontos cada). Michelle continua activa na sua carreira na Alemanha. Segundo a Wikipedia, em 2009 terá anunciado o fim da carreira, pelo menos com o nome Michelle, com álbum precisamente chamado "Goodbye Michelle", mas regressaria no ano seguinte.

Nusa Derenda (Eslovénia)

David Civera (Espanha)


Com 70 pontos, a Eslovénia repetiu o sétimo lugar de 1995 que, até 2021, permanece como o melhor resultado deste país. Nusa Derenda cantou o tema eurodance "Energy".
A vizinha Espanha foi representada por David Civera, natural de Teruel, província de Aragón. Civera participara em vários programas de televisão, como a versão espanhola do "Chuva De Estrelas" onde imitou Enrique Iglesias, mas foi com a sua participação na Eurovisão que a sua carreira arrancou. Em Copenhaga, cantou "Dile Que La Quiero" acompanhado por duas bailarinas ucranianas, obtendo um sexto lugar com 76, incluindo 12 de Israel. Uma das canções da pré-selecção espanhola de 2001 também fez algum sucesso por cá nesse ano, "Yo Quiero Bailar" de Sonia & Selena. Quanto a David Civera, obteve mais alguns hits nos anos seguintes (quando eu fui de férias a Espanha em 2002, tocava muito uma música dele que era "Que la detengan, que es una mentirosa...") e o seu último álbum, de 2016, assinalava quinze anos de carreira. 

Friends (Suécia)

Com uns rendondinhos cem pontos, a Suécia ficou em quinto lugar. O grupo Friends cantaram "Listen To Your Heartbeat" com nítida influências dos ABBA e até também tinham uma vocalista loura (Nina Inhammar) e outra morena (Kim Kärnfalk). Mas aparentemente ABBA não era a única influência, pois alguns notaram algumas semelhanças com "Liefde Ist Een Kaartspeel", a canção que tinha representado a Bélgica em 1996. A princípio os autores da canção sueca negaram, mas os autores da canção belga interpuseram uma acção legal através da SABAM (a Sociedade Belga de Autores) e o processo acabou com um acordo monetário entre ambas as partes. Em 2004, Nina Inhammar e Kim Kärnfalk lançaram um álbum como duo.  

Natasha St. Pier (França)

Não deixou de ser surpreendente o facto da canção da França ter sido cantada em francês e inglês, mas no fundo até fazia algum sentido pois a sua representante Natasha St. Pier era natural de New Brunswick, a única província do Canadá que tem as duas línguas como idiomas oficiais. Natasha cantou a balada "Je N'Ai Que Mon Âme" ("só tenho a minha alma") alcançando o quarto lugar com 142 pontos (incluindo 12 pontos de Bósnia-Herzegovina, Rússia e Portugal). Natasha St. Pier tem tido desde então uma carreira de grande sucesso nos países francófonos e foi mentora na versão belga do "The Voice".  

Antique (Grécia)

A Grécia obteve o seu melhor resultado de sempre até então, ao alcançar o terceiro lugar com 147 pontos, incluindo 12 pontos da Suécia e da Espanha. Os representantes era o duo Antique composto por Helena Paparizou e Nikos Panagiotidis, ambos nascidos na Suécia no seio de famílias imigrantes gregas com "I Would (Die For You)", um solarengo tema bilingue que eu facilmente imaginaria facilmente a ser tocada numa praia da ilha de Mykonos. Na minha opinião, a vitória deveria ter sido discutida entre Grécia e França. No entanto, aqueles que previam nos Antique aqueles que trariam a primeira vitória da Grécia na Eurovisão não estavam enganados de todo, pois o triunfo grego chegaria quatro anos depois com Helena Paparizou a solo.  

Rollo & King (Dinamarca)

Depois da vitória no ano anterior, a Dinamarca obteve mais um excelente resultado, ficando em segundo lugar. O duo Rollo & King defenderam o tema com sonoridades country "Never Ever Let You Go". Soren Poppe e Stefan Nielsen usaram os nomes dos seus cães para nomear o grupo, cujo álbum de 2000 tinha tido grande sucesso no seu país. No entanto quem acabou por dominar as atenções foi Signe Svendsen, a cantora recrutada que cantou ao lado de Poppe. A canção dinamarquesa obteve 177 pontos, com seis países.

Dave Benton & Tanel Padar (Estónia)

Contudo desde o início da votação que a Estónia tomou a liderança e apesar de a Dinamarca ter chegado a ameaçar, este país báltico ganharia com uma confortável margem. A Estónia arrecadou 198 pontos, com pontuações máximas de nove países e o único país que não deu quaisquer pontos foi Portugal. Tanel Padar (que tinha feito coro na canção da Estónia de 2000) e Dave Benton (natural da ilha caribenha de Aruba, pertencente ao Reino dos Países Baixos) defenderam o tema disco-pop "Everybody" acompanhados nos coros pela dance crew 2XL e o seu triunfo foi uma surpresa pois a canção não figurava entre as favoritas. E ainda hoje, não falta quem considere uma das vitórias menos meritórias da história do Festival da Eurovisão, até porque tanto antes como depois, a Estónia levou canções amplamente consideradas como sendo melhores. 



No entanto, este triunfo estoniano não deixa de ser um marco histórico pois tratava-se da primeira vitória no certame de um país da antiga União Soviética e, à parte a vitória da Jugoslávia de 1989, de um país leste-europeu. Além disso, Dave Benton tornou-se o primeiro cantor negro a vencer o Festival da Eurovisão e, com 50 anos à altura do certame, o cantor mais velho a conseguir tal proeza. Por amor a uma estoniana que conheceu num navio de cruzeiro, Benton mudou-se para aquele país. (Curiosamente, em 1981, competiu no Festival da OTI sob o seu verdadeiro nome Efrén Benita, representando as Antilhas Holandesas.)  

Festival da Eurovisão 2001 (comentários em polaco)








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