Nos anos 90, o ensino superior há muito que tinha deixado de ser uma ambição muito exclusiva e acessível a poucos em Portugal e era encarado pela maioria dos estudantes como o seguinte passo depois de terminado o ensino secundário. Não só porque, apesar de muitos protestos estudantis de "Não pagamos!", ter um filho a estudar no ensino superior era na altura algo comportável para cada vez mais famílias (fenómeno que infelizmente se encontra em processo inverso pelos motivos que se conhecem) como universidades, institutos politécnicos e escolas superiores - públicos e privados - floresciam que nem cogumelos um pouco por todo o país. E com esse florescimento, assistiu-se à proliferação das tunas académicas que levavam os seus cantos estudantis um pouco por todo o país. Algumas conseguiam mesmo actuar em espectáculos musicais fora do circuito académico e até na televisão.
E em 1994, um tema de um tunas conseguiu um êxito mainstream, passando nas rádios, surgindo no top de vendas e andando nas bocas de toda a gente, conferindo por um breve período de tempo toda uma aura de rockstars à Estudantina Universitária de Lisboa. Como é evidente, falo de "A Mulher Gorda", um daqueles temas que ficou para sempre arrumado na jukebox mental de cada português.
O tema acabou por ser a faixa que se destacou de "Serenata das Fitas", um álbum gravado pela Estudantina em 1993. Porém foi no ano seguinte que o tema se tornou um sucesso, nomeadamente pela sua utilização no programa da TVI "Doutores & Engenheiros", um concurso apresentado por Mila Ferreira e Nuno Graciano (quando ainda tinha cabelo) onde em cada programa, alunos de instituições de ensino superior competiam entre si, revisitando várias vertentes da vida académica (incluindo as agora muito debatidas praxes). Aliás em 1996, a RTP também continuou a explorar o filão com o programa "Efe-Erre-Á" que consistia numa competição entre tunas, apresentado por Manuel Luís Goucha (quando ainda ainda tinha bigode).
Graças a "A Mulher Gorda", o álbum da Estudantina foi disco de ouro. Apesar de algumas tentativas de fazer mais alguns hits, a EUL nunca conseguiu aproximar o sucesso desse tema e a notoriedade que alcançaram desvaneceu-se tão depressa como ela surgiu, se bem que ainda continue a ser uma grande referência no circuito das tunas académicas.
Quando eu entrei para a Universidade de Coimbra em 1998, já toda a aura de rockstars em volta das tunas académicas estava superada, mas ainda assisti a alguns espectáculos sobretudo durante a Queima das Fitas, em particular o encontro de tunas femininas no Jardim da Sereia (que era grátis, ao contrário do equivalente das tunas masculinas), evento apropriadamente denominado "O Canto da Sereia".
Para terminar, uma pequena nota. Na rádio local da minha cidade, Torres Novas, durante anos a fio, quando chegava a hora dos discos pedidos, era certo e sabido que a primeira ouvinte a pedir um disco era a Dona Sofia que invariavelmente começava o seu pedido assim "Bom dia/Boa tarde. Daqui fala Sofia Gonçalves Fortunato de Torres Novas. A frase é..." Certa vez a minha mãe ouviu a Dona Sofia a pedir precisamente "A Mulher Gorda" que ela dedicou "a todas mulheres que são todas bonitas, sejam gordas ou magras". Falecida em 2008, gosto de imaginar que a Dona Sofia continua a pedir discos no Além.
Excerto do programa "Doutores e Engenheiros" (1994-95):
Excerto do programa "Efe-Erre-Á" (1996):
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