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terça-feira, 1 de outubro de 2013

Chuva de Estrelas (1993-2000)

por Paulo Neto

Após um ano no ar, a SIC ainda voava baixinho mas aos poucos um Portugal sedento de mudança passava de estranhar a entranhar uma nova forma de fazer televisão, tão diferente a que estava habituado. Com a TVI nos seus primórdios (quando se designava por a 4) a ser orientada pela Igreja e sem ainda sem dar muita prioridade às audiências, coube à SIC fazer frente à RTP e transformar o panorama televisivo nacional, aproveitando o zeitgeist favorável: uma maior abertura de mentalidades na sociedade, a prosperidade económica proporcionada pela União Europeia e um país que se tornava cada vez mais cosmopolita menos fechado sobre si. Por isso, bastaram mais dois anos para que a estação de Carnaxide fosse líder de audiências durante o resto da década de 90. 


Estreado a 1 de Outubro de 1993, o "Chuva de Estrelas" é tido como um dos programas cruciais para a ascensão da SIC. Ainda hoje, são poucos os que não o referem como um dos programas mais marcantes do canal de Pinto Balsemão. Misturando puro entretenimento, uma excelente produção, diverso talento musical e uma apresentadora por quem Portugal inteiro se apaixonou, o sucesso não se fez esperar.

O programa era uma adaptação de um formato originário da Holanda, "The Sound Mix Show", estreado naquele país em 1985. Em cada sessão, um punhado de concorrentes tinha a oportunidade de se transformar numa estrela da música e cantar como ela. Após as eliminatórias, tinham lugar as semifinais e a grande final onde se coroava o vencedor absoluto. 

Em Portugal, "Chuva de Estrelas" teve sete edições, exibidas entre 1993 e 2000. As duas primeiras foram apresentadas por Catarina Furtado, a terceira por José Nuno Martins e as restantes quatro por Bárbara Guimarães.


1993/1994 Ainda hoje muitos apontam como a primeira como melhor edição do programa embora tivesse o cenário mais pequeno e tivesse sido toda emitida em diferido, incluindo a final. Em cada emissão, o público da assistência escolhia um concorrente apurado para a fase seguinte e o júri de convidados outro. Pelas cadeiras do júri passaram Simone de Oliveira, Paco Bandeira e Lena D'Água na fase das eliminatória e Sérgio Godinho, Rita Guerra e Adelaide Ferreira nas semifinais. A vencedora foi Sara Tavares que imitou Whitney Houston e ainda em 1994 venceria o Festival da Canção com "Chamar a Música". Outros concorrentes notórios foram Paula Morais de Sá (4 Non Blondes), Jacinta Matos (Ella Fitzgerald), Pedro Miguéis (Righteous Brothers) e Ana Ritta (Mariah Carey, que cantaria a versão alternativa do tema dos "Olhos de Água").

Essa primeira edição também foi especial para mim porque nela concorreu um professor da minha escola...que morava no apartamento ao lado do meu. José Lucas Lemos, o "stôr Lucas", era professor de Educação Física mas tinha uma carreira paralela como cantor. Ele imitou Freddy Mercury cantando "We Are The Champions", mas apesar dos elogios não passou à semifinal.
Agora outra revelação: ainda nesse ano houve na minha escola um "Chuva de Estrelas" onde eu concorri! Como a canção que eu queria inicialmente cantar era demasiado complexa para ser adaptada ("I'd Do Anything For Love" dos Meat Loaf), foi o próprio stôr Lucas que sugeriu que eu cantasse a mesma música que ele tinha levado ao "Chuva..." e foi assim que subi ao palco como Freddy Mercury, com T-shirt de alças branca, calças verdes e bigodes e pêlos do peito pintados (pois eu ainda não era prolífico em pilosidades como agora). Apesar dos elogios que recebi, a vitória sorriu à minha colega que tinha encarnado outra estrela defunta, Janis Joplin.

1994/1995 Várias mudanças ocorreram nesta série: um cenário maior (reciclado do "Mini Chuva de Estrelas"), um tema de genérico cantado por Nucha, um corpo de baile e uma final em directo do Coliseu dos Recreios, com o vencedor escolhido pelos telespectadores. Ramón Galarza e Pilar Homem de Mello (depois substituída por Rita Guerra) eram o júri residente ao qual se juntava um convidado em cada sessão. A partir desta edição, o número de concorrentes apurados em cada sessão podia ir de um a três.  
Rapando a sua cabeça para encarnar Sinead O'Connor, Inês Santos foi a vencedora desta edição. Mas esta também foi a edição de João Pedro Pais, que ficou em segundo lugar imitando os Delfins. Outros concorrentes a destacar são André Letra (dos Miguel e André, como Eros Ramazotti), Marta Plantier (Aretha Franklin), Carlos Coincas (Luís Represas) e João Portugal (Roupa Nova). Também recordo um concorrente cujo nome não me lembro que cantou "Forever Young" dos Alphaville, uma canção que até então lembrava-me muito pouco e passou a ser uma das minhas favoritas de sempre. Nesta edição, participou outro concorrente da minha cidade, Luís Filipe Lourenço, a cantar "One" dos U2, tendo chegado a uma semifinal.  



1995/1996 Com Catarina Furtado a colocar um hiato na sua carreira televisiva para estudar representação em Londres, José Nuno Martins apresentou a terceira edição e o programa passou a ser emitido ao Domingo. Rita Ribeiro e Miguel Ângelo eram os júris residentes. Outra novidade era que bandas também podiam concorrer. 
O vencedor foi  Rui Faria como Elton John, que foi o representante português na primeira final europeia dos Chuva de Estrelas onde ficou em segundo lugar. Outra concorrente notória foi Célia Lawson (Oleta Adams) que ganhou o Festival da Canção em 1997. Sofia Lisboa (Céline Dion) não passou da sua eliminatória (ao contrário da sua irmã Sónia que tinha chegado à final na edição transacta como Mireille Mathieu)  mas conheceria grande sucesso como a parcela feminina dos Silence 4. 


1997 Já com Bárbara Guimarães a conduzir a apresentação e Fernando Martins como júri residente, esta foi a edição mais curta com doze eliminatórias onde o apurado seguia directamente para a final. Jessi Leal imitando Kate Bush foi a vencedora, mas a interpretação de Pedro Bragado como Prince também ficou na memória. O actor Manuel Marques também passou  por esta edição cantando um tema de "Miss Saigon".



1997/1998 Encarnando Michael Stipe dos REM, Carlos Bruno foi o indiscutível vencedor da quinta edição e ainda por cima, também venceu a final europeia. Mas quem teve quase tão protagonismo foi a mãe do próprio Carlos, que desatava num choro semi-histérico sempre que o filho cantava, algo que foi amplamente explorado na realização do programa, até na final europeia. Lembro-me que a senhora foi muito criticada por fazer aquela figura.
Em segundo lugar ficou Paula Teixeira (Gloria Estefan) um rosto que ainda hoje reconhecemos por fazer linguagem gestual em vários programas. Sofia Barbosa (Oleta Adams), vencedora da primeira Operação Triunfo e Vanessa Silva (Amanda Marshall) também foram finalistas desta edição.


1998/1999 Ricardo Sousa e Sandra Godinho conheceram-se no casting para o programa e decidiram concorrer em dueto como Meat Loaf e Ellen Foley, e em dueto venceram. Miguel Belo, dos Lulla Bye (The Verve) e Teresa Radamanto (Barbra Streisand) também concorreram nesta edição.


1999/2000 Na última edição, vitória para Nádia Sousa, vocalista dos Spelling Nadja,  num papel químico de Edith Piaf.


Mas sem retirar nenhum mérito a José Nuno Martins e muito menos a Bárbara Guimarães, sem dúvida que eu e a maioria dos portugueses recordam sobretudo as edições do "Chuva de Estrelas" apresentadas por Catarina Furtado. Já a conhecíamos do Top + na RTP e dos blocos da MTV exibidos nos primórdios da SIC mas foi aqui que ela encantou Portugal tão ou mais que os concorrentes que cantavam (lembram-se do slogan: "Cante ou encante com o Chuva de Estrelas!"). Aliando a descontracção e irreverência próprias da sua idade (tinha 21 anos aquando da primeira edição) e uma maturidade profissional, Catarina tornou-se a estrela do programa e a namoradinha de Portugal de então, conquistando miúdos e graúdos, homens e mulheres. Juntando-se uma produção de qualidade e vários talentos descobertos por esse Portugal fora, o programa conquistou Portugal e foi peça importante na incrível ascensão da SIC a líder de audiências. 
Recordo-me de quanto os fins de tarde de sexta-feira nessa altura eram tão deliciosos para mim, com o início do fim-de-semana e um serão televisivo em cheio em perspectiva, primeiro com Catarina Furtado e o "Chuva de Estrelas" e depois Alexandra Lencastre "Na Cama Com..." quem quer fosse. E quem ainda não se recorda do tema de encerramento, adaptado do "Thank You For The Music" dos ABBA?

Vivo para a música
Canções que canto
Com a alegria e o encanto

P'ra viver sem ela
Como é que eu vou fazer
Como vai ser

Sem uma canção, uma ilusão
Por isso vivo para a música
Pelo tanto que me dá.

Genérico do programa:



Final da 1.ª temporada:


Final da 7.ª temporada





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